RESENHA DO FILME "AS INVASÕES BÁRBARAS"

O filme “AS INVASÕES BÁRBARAS” é maravilhoso, ele trata da vida e do processo saúde/doença de Remy, o qual possui câncer no cérebro em um grau avançadíssimo.

Começa o filme com a ex-esposa de Remy ligando para o filho, Sebantien, para pedir ao filho que vá para a França ajudar ela nos cuidados de seu pai, como ele não falava com o pai há muito tempo houve um momento de dúvida entre ir ou não, mas como ele tem muito dinheiro e condições de trabalhar a distância, pois é um empresário que trabalha com questões que envolvem grandes quantias em dinheiro e riscos de mercado, fala com a sua esposa e ambos vão de Londres para a França.

Remy possui outra filha chamada de Syhaine, mas ela trabalha viajando de barco pelo mundo e não tinha como ver o pai, assim se comunica com ele durante o filme através de dois vídeos enviados ao irmão.

Ao chegar no hospital para ver o seu pai, Sebastien, se depara com um sistema de saúde completamente precário, no qual há pessoas nos corredores, fios caindo do teto, uma superlotação absurda. Assim, como tem um amigo médico, acaba entrando em contato com ele para verificar qual seria a situação de seu pai, mas o hospital não tem condições de fazer o exame necessário no cérebro, dessa forma acaba levando seu pai para Baltimore, EUA, para fazer o exame e descobre que o seu estado de saúde é mais grave do que se imaginava e é aconselhado por seu amigo a fazer um tratamento experimental com heroína, em razão de ser 5x mais potente que a morfina, que não adiantava mais na dor.

Nesse momento o filho sugere ao pai que faça o tratamento nos Estados Unidos, mas o pai não aceita, pois viveu toda a sua vida na França e aceitou o sistema de saúde do país da forma que ele é, mas o filho fica um pouco revoltado com o pai e acaba pensando em desistir de ficar nesse momento com ele. Nesse contexto, percebe-se a diferença de pensamento do pai e do filho, o primeiro possui uma visão socialista, batalhou pelo sistema público de saúde na sua época, e o segundo é liberal. Entretanto, sua mãe, Luise, fala que Sebastien é a pessoa ideal para ajudar o seu pai e que se quer ajudar ele deve arrumar um quarto individual e trazer os amigos que deixariam seu pai feliz nesse momento complicado. Assim, devido ao dinheiro que Sebastien possui ele consegue autorização, subornando a dona do hospital e os responsáveis pelo sistema de saúde, para que seu pai seja transferido para o andar do hospital que não está funcionando.

Concomitantemente, entra em contato com os amigos de seu pai (duas mulheres que foram suas amantes, um amigo homossexual e outro casado com uma mulher mais jovem), os quais vão até o hospital e ficam ao lado de Remy até o seu ultimo momento de vida. Em uma das conversas entre Remy e seus amigos, ele comenta que antigamente dormia pensando em belas mulheres, mas um dia dormiu pensando no mar do Caribe e nesse momento percebeu que a velhice tinha chegado. Percebe-se como é difícil aceitar que a vida está chegando ao fim e como arrependimentos por achar que vivemos menos do que deveríamos se manifestam nesse momento.

No hospital, Remy conversa sempre com uma freira que distribui hóstia para os pacientes, o qual tenta convencê-la de que a igreja é má e que não existe o Deus que ela acredita, mas em uma das conversas ela explica que se tantas maldades ocorreram deve ter alguém que possa perdoar essas pessoas e na despedida dos dois ela salienta: “aceite o ministério, se você o aceitar será salvo”. Percebe-se que a freira tenta colocar na mente de Remy uma esperança de que há algo depois da morte, que ele não poderia ter medo dela.

Querendo ajudar Remy, Sebastien encontra Nathalie, filha de uma das amigas de seu pai e viciada em drogas, para comprar Heroína, a qual passa a ser responsável por dar a droga a Remy todas as noites. Em uma das conversas entre Nathalie e Remy, quando falam sobre o medo de morrer que Remy tem e Nathalie não, ela fala para ele: “Não é o presente que você não quer largar, é o passado e essa vida já está morta”.  

Outro fato que chamou a atenção foi o apego que Remy tinha ao fato de lecionar, antes de descobrir a doença ele era professor universitário e os seus alunos não se importaram com o fato dele deixar de dar aula, sendo facilmente substituído por outra professora na universidade. Assim, seu filho paga três alunos para irem vê-lo e informar que estão sentindo a falta dele. Remy, enquanto está internado no hospital, fala que não teve nenhum prestigio na vida, não escreveu nenhum livro, não foi alguém importante que será lembrado. Penso que um medo que costumamos ter, pode ser por vivermos em um mundo que dá muita importância ao que os outros pensam e falam, é de não termos feitos nada importante em vida, não termos deixado nossa marca no mundo e esse medo se reflete nesse processo de Remy.

Percebendo que não há mais o que fazer com Remy, Sebastien leva o seu pai para a casa de praia de um dos amigos, nesse local Remy passa os últimos momentos de sua vida, mas na ida até a casa Remy comenta que não consegue aceitar a morte, que ele sente a necessidade de encontrar um sentido para isso tudo.

Após passar alguns dias na casa da praia, Remy pede ao seu filho para que lhe deem uma overdose de heroína. Assim, Remy se despede de todas as pessoas que estavam nesse momento de sofrimento e autoconhecimento com ele. Porém a despedida mais marcante foi a com o filho, na qual Remy diz: “Sabe o que eu quero para você? Que você tenha um filho tão bom quanto você.”.

O filme nos faz ter muitas reflexões, pois trata do sistema de saúde precário, no qual há corrupção (Remy conseguiu viver a doença de forma diferente dos outros pacientes que não tinham condições financeiras de pagar de forma ilegal as pessoas que trabalhavam no sistema de saúde), trata da forma em que os laços familiares acabam se unindo novamente em um momento difícil (caso Remy não tivesse ficado doente, ele ainda não falaria com o seu filho),  trata das amizades (mesmo solicitados por Sebastien para ficaram com Remy, acabam se envolvendo emocionalmente com o ocorrido e sentem a morte do amigo), trata do abando das pessoas nos hospitais (diversos pacientes não tinham nenhuma visita), entre outros.

Remy teve a opção de escolher morrer, ele não teve que ficar acamado até não ter mais condições dos medicamentos o manterem vivo e não respondendo mais pelos seus desejos, sem chances de melhora. É triste que uma pessoa atualmente tenha que sofrer muito até a sua morte e que não possa escolher o que deseja fazer, enquanto a eutanásia não for legalizada somente pessoas como Remy ou nem mesmo pessoas assim, que tem um filho com condição financeira de passar por cima do sistema, terão condições de tirarem sua própria vida.

O filme me fez refletir muito e pensar muito no que aconteceu na minha vida no último ano, pode ser que em razão de Remy ter câncer e não ter mais o que fazer, fato que também aconteceu com pessoas próximas a mim, mas essas pessoas próximas a mim ficaram algum tempo sofrendo no hospital sem conseguir falar e não tendo mais o que fazer, e dói muito pensar em pessoas que amamos e não conseguimos diminuir o sofrimento delas no final da vida.

Saliento que questões éticas também são debatidas no filme, como quando o filho decide que deve comprar heroína para o pai, quando o médico receita a droga e quando uma enfermeira injeta a droga no paciente.


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